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quinta-feira, 11 de junho de 2009

VOTO DO MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADI 3934) DO PDT CONTRA A LEI DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL

VOTO DO MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADI 3934) DO PDT CONTRA A LEI DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Íntegra do voto do ministro Ricardo Lewandowski na ADI contra dispositivos da Lei de Recuperação Judicial
Extraído de: Supremo Tribunal Federal - 28 de Maio de 2009
Leia a íntegra do voto do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3934) do PDT contra a Lei de Recuperação Judicial (Lei 11.101/05). Por maioria, a Corte julgou a ação totalmente improcedente, seguindo o voto do ministro Lewandowski, relator do processo. A decisão foi tomada nesta quarta-feira (27).

Íntegra do voto do ministro Ricardo Lewandowski:


AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.934-2 DISTRITO
FEDERAL
RELATOR : MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
REQUERENTE(S) : PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA
ADVOGADO(A/S) : SEBASTIÃO JOSÉ DA MOTTA E OUTRO(A/S)
REQUERIDO(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA
ADVOGADO(A/S) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
REQUERIDO(A/S) : CONGRESSO NACIONAL
INTERESSADO(A/S) : SINDICATO NACIONAL DOS AEROVIÁRIOS
ADVOGADO(A/S) : ELIASIBE DE CARVALHO SIMÕES E OUTROS
ADVOGADO(A/S) : DAMARES MEDINA
INTERESSADO(A/S) : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA -
CNI
ADVOGADO(A/S) : SÉRGIO MURILO SANTOS CAMPINHO E
OUTRO(A/S)
ADVOGADO(A/S) : CASSIO AUGUSTO MUNIZ BORGES
R E L A T Ó R I O
O Sr. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI: Trata-se de
ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida
liminar, proposta pelo Partido Democrático Trabalhista –
PDT, na qual impugna os arts. 60, parágrafo único, 83, I e
IV, c, e 141, II, da Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005,
que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a
falência do empresário e da sociedade empresária, por
entender incompatíveis com o disposto nos arts. 1º, III e
IV, 6º, 7º, I, e 170, VIII, da Constituição Federal.

Os dispositivos atacados possuem o seguinte
teor:
“Art. 60. Se o plano de recuperação judicial aprovado envolver alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor, o juiz ordenará a sua realização, observado o disposto no art. 142 desta Lei.
Parágrafo único. O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, observado o disposto no § 1º do art. 141 desta Lei”.
“Art. 83. A classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem:
I – os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e
cinquenta) salários-mínimos por credor, e os decorrentes de acidente de trabalho;
(...);
VI – créditos quirografários, a
saber:
(...);
c) os saldos dos créditos derivados
da legislação do trabalho que excederem o limite
estabelecido no inciso I do caput deste artigo”.
“Art. 141. Na alienação conjunta ou
separada de ativos, inclusive da empresa ou de
suas filiais, promovida sob qualquer das
modalidades de que trata este artigo:
(...).
II. O objeto da alienação estará
livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do
arrematante nas obrigações do devedor, inclusive
as de natureza tributária, as derivadas da
legislação do trabalho e as decorrentes de
acidentes de trabalho”.
Em primeiro lugar, o requerente identifica nos
dispositivos impugnados inconstitucionalidade de natureza
formal, pois teriam disciplinado matéria relativa à
“despedida arbitrária ou sem justa causa”, por lei
ordinária, a qual, no seu entender, somente poderia ser
regulada por lei complementar, a teor do art. 7º, I, da
Carta Magna.
Depois, o requerente encontra neles
inconstitucionalidade de ordem material, porquanto, ao
liberarem os arrematantes de empresas alienadas
judicialmente das obrigações trabalhistas, tornando-os
imunes aos ônus de sucessão, estariam afrontando os valores
constitucionais da dignidade da pessoa humana, do trabalho
e do pleno emprego, abrigados nos arts. 1º, III e IV, 6º e
170, VIII, da Lei Maior.
Outra inconstitucionalidade material flagrada
pelo requerente é a qualificação, como quirografários, dos
créditos derivados da legislação do trabalho que
ultrapassem 150 (cento e cinquenta) salários mínimos,
porque tal disposição violaria a garantia do direito
adquirido e a vedação de tomar-se o salário mínimo como
referência de qualquer natureza, tratados nos arts. 5º,
XXXVI, e 7º, IV, da Constituição.
Segundo o requerente, o regramento impugnado,
nesse aspecto
“passará a constituir caminho fácil
para o desrespeito aos direitos adquiridos pelos
empregados no curso da relação desenvolvida com
seu empregador, que vindo a prestigiar outros
credores comuns e, uma vez acumulando com eles
grandes dívidas, delas poderá se livrar com a
simples realização de uma alienação judicial em
falência” (fl. 9).
Com esses argumentos, alinhavados em resumo,
almeja ver reconhecida a procedência da ação para que seja
declarada
“a inconstitucionalidade do artigo
83, incisos I e VI, letra ‘c’ da Lei 11.101/05,
na parte em que limita os créditos trabalhistas
em falência ou recuperação judicial ao montante
de 150 (cento e cinquenta) salários mínimos e do
artigo 141, inciso II, da mesma Lei 11.101/05,
na parte em que isenta o adquirente de empresa,
filial ou unidade produtiva, nos casos de
falência, de obrigações de natureza trabalhista,
ambos com efeito ex tunc.”
E, ainda,
“seja dada interpretação conforme ao
artigo 60, parágrafo único, da mesma norma (Lei
11.101/2005), de modo a que seja esclarecido que
os adquirentes de unidades produtivas ou
empresas, em processos de recuperação judicial,
respondem pelas obrigações derivadas da
legislação do trabalho” (fls. 22-23).
Às fls. 166-184, a Presidência da República, em
síntese, informou que
“os dispositivos atacados (...) longe
de afrontar a Lei Maior, cumprem-na
rigorosamente, prestigiando exatamente a
dignidade da pessoa humana, o emprego e o
trabalho.
Fazem-no (...) dentro do contexto
excepcionalíssimo de uma situação de
insolvência, em que a recuperação não comporta a
observância dos mesmos parâmetros da
normalidade, sob pena de em lugar de se garantir
aos trabalhadores o que é possível, não se poder
lhes garantir nada, pelo fato consumado da falta
absoluta de recursos (...).
(...).
A rigor, a exordial está arguindo a
inconstitucionalidade do pagamento escalonado e
a constitucionalidade da insolvência e de
pagamento nenhum”.
O Advogado-Geral da União, às fls. 187-205,
opinou pelo não conhecimento da ação quanto ao art. 60,
parágrafo único, por ser a “interpretação pretendida pelo
autor (...) exatamente oposta àquela oferecida pela norma
entendida de forma singela e literal”, bem como pela
improcedência do pedido quanto aos demais dispositivos, em
parecer assim ementado:
“Comercial. Lei de Falências (Lei nº
11.101/2005). Novos paradigmas. Interesse social
na preservação da empresa e dos postos de
trabalho. Constitucionalidade dos arts. 60,
parágrafo único; 83, I e VI, ‘c’, e 141, II, da
Nova Lei de Falências. Manifestação pelo não
conhecimento da impugnação quanto ao art. 60,
parágrafo único, da lei, e pela improcedência do
pedido com relação aos demais dispositivos” (fl.
187).
Às fls. 207-217, o Congresso Nacional suscitou,
em preliminar, o não conhecimento da ação, pois não teria
sido incluído no pedido o § 2º do art. 141 da Lei
11.101/2005, que ostenta a seguinte redação:
“§ 2º Empregados do devedor
contratados pelo arrematante serão admitidos
mediante novos contratos de trabalho e o
arrematante não responde por obrigações
decorrentes do contrato anterior”.
De acordo com o Advogado-Geral do Congresso
Nacional,
“mesmo a eventual procedência da ação
deixaria remanescer no mundo jurídico aquela
norma não impugnada, com manutenção da situação
derivada de seu comando.
E, face à impossibilidade de
conhecimento jurisdicional ex officio da
matéria, não resta outro caminho além do não
conhecimento da presente ação direta” (fl. 212).
No mérito, repete, em linhas gerais, os
argumentos da Presidência da República.
Às fls. 219-227, o Procurador-Geral da República
manifestou-se pela improcedência do pedido, em parecer que
recebeu a ementa abaixo transcrita:
“AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE. ARTS. 60, PARÁGRAFO
ÚNICO, 83, INCISOS I E VI, LETRA ‘C’, E 141,
INCISO II, DA LEI 11.101/2005, QUE REGULA A
RECUPERAÇÃO JUDICIAL, A EXTRATERRITORIALIDADE E
A FALÊNCIA DO EMPRESÁRIO E DA SOCIEDADE
EMPRESÁRIA. NÃO CONHECIMENTO DA AÇÃO, COM
RELAÇÃO AOS ARTS. 60 E 141, POR CARÊNCIA DE
IMPUGNAÇÃO DA ÍNTEGRA DO COMPLEXO NORMATIVO
ATINENTE AO TEMA. MÉRITO. SUCESSÃO DE ENCARGOS
TRABALHISTAS NAS ALIENAÇÕES DO ATIVO DE EMPRESAS
SUJEITAS À RECUPERAÇÃO JUDICIAL OU FALÊNCIA.
RESPEITO AOS DIREITOS SOCIAIS, À CONTINUAÇÃO DA
ATIVIDADE EMPRESARIAL E À PRESERVAÇÃO DE
EMPREGOS. CRÉDITOS TRABALHISTAS EM MONTANTE
SUPERIOR A 150 SALÁRIOS MÍNIMOS. CONVERSÃO EM
QUIROGRAFÁRIOS. RAZOABILIDADE E RESPEITO AO
PRINCÍPIO DA ISONOMIA. PARECER PELA
IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO” (fl. 219).
O Sindicato Nacional dos Aeroviários, às fls.
228-246, pleiteou seu ingresso na presente ação na
qualidade de amicus curiae. O pedido foi deferido às fls.
344-345.
Às fls. 351-362, a Confederação Nacional da
Indústria – CNI também postulou seu ingresso como amicus
curiae, sendo o pleito deferido às fls. 397-398.
Igualmente, a Gol Transportes Aéreos S.A
pretendeu ingressar nos autos nas mesmas condições, as fls.
392-394, mas seu pedido foi indeferido, às fls. 400-401.
É o relatório, cujas cópias serão distribuídas
aos Exmos. Srs. Ministros.


AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.934-2 DISTRITO
FEDERAL


V O T O
O Sr. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI (Relator):
Examino cada um dos aspectos levantados na inicial, na
ordem em que foram levantados.
Inicio pela análise da alegada inconstitucionalidade formal dos dispositivos legais
impugnados, por afronta à reserva constitucional de lei complementar, a qual, todavia, não consigo identificar na espécie.
Com efeito, nos termos do art. 22, I, da
Constituição Federal, compete privativamente à União
legislar sobre direito do trabalho, não estando ela
obrigada a utilizar-se de lei complementar para disciplinar
a matéria, que somente é exigida, nos termos do art. 7º, I,
da mesma Carta, para regrar a dispensa imotivada. Esse
tema, porém, definitivamente, não constitui objeto da Lei
11.101/2005.
Não é difícil constatar, a meu ver, que o escopo
do referido diploma normativo restringe-se a estabelecer
normas para a recuperação judicial e a falência das
empresas, além de proteger os direitos de seus credores.
Mesmo que se considere que a eventual
recuperação ou falência da certa empresa ou, ainda, a venda
de seus ativos acarrete, como resultado indireto, a
extinção de contratos de trabalho, tal efeito subsidiário
nada tem a ver com a “despedida arbitrária ou sem justa
causa”, que decorre sempre de ato volitivo e unilateral do
empregador.
É bem de ver que os contratos de trabalho não se
rompem necessariamente nessas hipóteses, nem mesmo na
circunstância extrema da falência, verificando-se,
inclusive, que o art. 117 da Lei em comento prevê que os
contratos bilaterais, dos quais a relação de emprego
constitui exemplo, não se resolvem de forma automática,
visto que podem ser cumpridos pelo administrador judicial
em proveito da massa falida.
O rompimento do vínculo empregatício, naquelas
hipóteses, resulta da situação excepcional pela qual passa
a empresa, ou seja, por razões de força maior, cujas
consequências jurídicas são, de há muito, reguladas por
norma ordinária, a exemplo do art. 1.058 do antigo Código
Civil, e do art. 393 do novo Codex, bem assim dos arts. 501
a 504 da Consolidação das Leis do Trabalho.
Convém registrar que, a rigor, um dos principais
objetivos da Lei 11.101/2005 consiste justamente em
preservar o maior número possível de empregos nas
adversidades enfrentadas pelas empresas, evitando ao máximo
as dispensas imotivadas, de cujos efeitos os trabalhadores
estarão protegidos, nos termos do art. 10, II, do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias, de aplicabilidade
imediata, segundo entende esta Corte, enquanto não
sobrevier lei complementar disciplinadora. 1
Não prospera, assim, o argumento de que os
dispositivos impugnados regulam “ato jurídico que gera a
extinção automática do contrato de trabalho” (fl. 14),
mesmo porque, como nota Jorge Luiz Souto Maior, a dispensa
coletiva de empregados não figura, no art. 50 da Lei
11.101/2005, como um dos meios de recuperação judicial da
empresa. 2
Este Tribunal, de resto, já firmou o
entendimento de que a reserva de lei complementar
1 RE 449.420-5/PA, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU, 14. out. 2005.
2 MAIOR, Jorge Luiz Souto. Negociação Coletiva de Trabalho em Tempos de
Crises Econômicas. Disponível em:
http://www.diap.org.br/index.php/artigos/7223-negociacao-coletiva-detrabalho-
em-tempos-de-crise-economica. Acesso em: jan.2009.
restringe-se àquelas situações para as quais a própria
Constituição exigiu tal instrumento de forma expressa, não
se admitindo qualquer tipo de analogia ou relação de
similitude material. Nesse sentido, o Min. Celso de Mello,
Relator da ADI 789/DF, assentou que o domínio normativo da
lei complementar
“apenas se estende àquelas situações
para as quais a própria Constituição exigiu – de
modo expresso e inequívoco – a edição dessa
qualificada espécie de caráter legislativo.
(...)
(...) a exigência de lei complementar
não se presume e nem se impõe, quer por
analogia, quer por força de compreensão, quer,
ainda, por inferência de situações que possam
guardar relação de similitude entre si”.
Definida a questão que envolve compatibilidade
formal dos dispositivos impugnados diante da Carta Magna,
passo, na sequência, a examiná-los quanto à sua alegada
inconstitucionalidade material. Começo pela análise da
ausência de sucessão no tocante às dívidas trabalhistas.
Nesse aspecto, o requerente sustenta que os
arts. 60, parágrafo único, e 141, II, da Lei 11.101/05 são
inconstitucionais do ponto de vista substantivo, ao
estabelecerem que o arrematante das empresas em recuperação
judicial não responde pelas obrigações do devedor, em
especial as derivadas da legislação do trabalho.
Como visto, a AGU e a PGR manifestaram-se, em
preliminar, pelo não conhecimento da ADI no tocante à
impugnação desses dois dispositivos, sob argumento de que a
eventual procedência da ação quanto a estes não eliminaria
o alegado vício, pois o ordenamento jurídico continuaria a
contemplar a não sucessão das obrigações trabalhistas do
arrematante.
Nesse sentido, o Ministério Público Federal
assentou, textualmente, que
“a falta de impugnação do § 2º do
art. 141 da lei em questão prejudica o pedido
deduzido em relação ao inciso II deste mesmo
artigo e ao art. 60. Afinal, ainda que se
admitam as especificidades de cada qual, não há
dúvidas de que, com base na previsão mantida
incólume de que ‘o arrematante não responde por
obrigações decorrentes do contrato [de trabalho]
anterior’ (art. 141, § 2º), permaneceriam a
cargo exclusivo do devedor as dívidas
trabalhistas. Não seria alcançado, portanto, o
fim precípuo das impugnações deduzidas neste
particular, que reside justamente em
reconhecimento expresso de que ‘os adquirentes
(...) respondem pelas obrigações derivadas da
legislação do trabalho’" (fl. 222).
De fato, embora tal lacuna na inicial pudesse,
dentro de uma visão mais ortodoxa, levar ao reconhecimento
da prejudicialidade da ação quanto à impugnação dos citados
dispositivos, não tem ela, contudo, a meu ver, o condão de
torná-la inepta, diante da possibilidade, em tese, de a
Corte decretar a inconstitucionalidade § 2º do art. 141 por
arrastamento, caso venha a concluir que a ausência de
sucessão, no caso de débitos trabalhistas, ofende a Carta
Magna.
Conheço, pois, da ação, adiantando, todavia, que
não identifico a inconstitucionalidade aventada pelo
requerente quanto aos arts. 60, parágrafo único, e 141, II,
da Lei 11.101/05.
Primeiro, porque a Constituição não abriga
qualquer regra expressa sobre o eventual direito de
cobrança de créditos trabalhistas em face daquele que
adquire ativos de empresa em processo de recuperação
judicial ou cuja falência tenha sido decretada.
Depois, porque não vejo, no ponto, qualquer
ofensa direta a valores implícita ou explicitamente
protegidos pela Carta Política. No máximo, poder-se-ia
flagrar, na espécie, uma colisão entre distintos princípios
constitucionais. Mas, mesmo assim, não seria possível
falar, no dizer de Luís Virgílio Afonso da Silva, “nem em
declaração de invalidade de um deles, nem em instituição de
uma cláusula de exceção”, 3 visto ter o legislador
ordinário, apenas, estabelecido, nas palavras de Robert
Alexi, “relações de precedência condicionada”. 4
É que, na conhecida definição do referido
jurista germânico, princípios são mandamentos de
otimização, ou seja, normas que exigem que algo seja
realizado na maior medida possível diante das condições
fáticas e jurídicas existentes, razão pela qual a sua
concretização demanda sempre um juízo de ponderação de
interesses opostos, à luz de uma situação concreta.5
As condições fáticas e jurídicas, no seio das
quais o juízo de ponderação é levado a cabo, contudo, nem
sempre são as ideais, visto que a tendência expansiva dos
princípios tende a fazer com que a realização de um deles
no mais das vezes, se dê em detrimento da concretização de
outro. 6
No caso, o papel do legislador
infraconstitucional resumiu-se a escolher dentre os
distintos valores e princípios constitucionais, igualmente
aplicáveis à espécie, aqueles que entendeu mais idôneos
3 SILVA, Luís Virgílio Afonso da. Direitos Fundamentais – conteúdo
essencial, restrições eficácia. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 50.
4 ALEXI, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro
de Estúdios Constitucionales, 1993, p. 91-92.
5 Idem, loc.cit.
6 SILVA, Luís Virgílio Afonso da. Op.cit., loc. cit.
para disciplinar a recuperação judicial e a falência das
empresas, de maneira a assegurar-lhes a maior expansão
possível, tendo em conta o contexto fático e jurídico com o
qual se defrontou.
Assim, o exame da alegada inconstitucionalidade
material dos dispositivos legais que estabeleceram a
inocorrência de sucessão das dívidas trabalhistas, na
hipótese da alienação judicial de empresas, passa
necessariamente pelo exame da adequação da escolha feita
pelo legislador ordinário no tocante aos valores e
princípios constitucionais aos quais pretendeu emprestar
eficácia.
Ora, analisando a gênese do diploma normativo
cujos dispositivos se encontram sob ataque, verifico que
ele resultou de um projeto de lei, o PL 4.376/1993, o qual
tramitou por cerca de onze anos no Congresso Nacional. Após
longas e aprofundadas discussões, os parlamentares
aprovaram a Lei 11.101/2005, revogando concomitantemente o
Decreto-lei 7.661/1945, que antes regia a matéria.
Em parecer ofertado à Comissão de Assuntos
Econômicos do Senado Federal, o Senador Ramez Tebet,
relator do projeto em questão, deixou anotado o seguinte:
“A fim de conhecer as opiniões dos
diversos segmentos da sociedade sobre o assunto
e democratizar o debate, esta Comissão promoveu,
nos meses de janeiro e fevereiro de 2004,
audiências públicas acerca do PLC nº 71, de
2003, em que foram ouvidas centrais sindicais,
representantes das associações e confederações
comerciais e industriais, das micro e pequenas
empresas, dos bancos e do Banco Central, das
empresas de construção civil, dos produtores
rurais, do Poder Judiciário, do Ministério
Público, do Governo Federal, e outros
especialistas em direito falimentar. Além disso,
recebemos numerosas sugestões por escrito, que
também contribuíram para o aprofundamento do
debate”. 7
Embora houvesse um consenso generalizado, na
doutrina, acerca da excelência técnica do texto normativo
editado em 1945, registrava-se também uma crescente
concordância na comunidade jurídica quanto ao seu
anacronismo diante das profundas transformações
socioeconômicas pelas quais passou o mundo a partir da
segunda metade do Século XX, e que afetaram profundamente a
vida das empresas.
Rubens Approbato Machado, por exemplo, ao
comentar a nova Lei, afirma que
“a falência (...) e a concordata,
ainda que timidamente permitissem a busca da
recuperação da empresa, no decorrer da longa
vigência do Decreto-lei 7.661/45 e ante as
mutações havidas na economia mundial, inclusive
7 Parecer do Senador Ramez Tebet para a Comissão de Assuntos Econômicos
– CAE, 2003, p. 11-13.
com a sua globalização, bem assim nas periódicas
e inconstantes variações da economia brasileira,
se mostram não só defasadas, como também se
converteram em verdadeiros instrumentos da
própria extinção da atividade empresarial.
Raramente, uma empresa em concordata conseguia
sobreviver e, mais raramente ainda, uma empresa
falida era capaz de desenvolver a continuidade
de seus negócios. Foram institutos que deixavam
as empresas sem qualquer perspectiva de
sobrevida”. 8
Essa foi também a visão do relator do projeto na
Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal:
“A realidade sobre a qual se debruçou
Trajano de Miranda Valverde para erigir esse
verdadeiro monumento do direito pátrio, que é a
Lei de Falências de 1945, não mais existe. Como
toda obra humana, a Lei de Falências é
histórica, tem lugar em um tempo específico e
deve ter sua funcionalidade constantemente
avaliada à luz da realidade presente. Tomar
outra posição é enveredar pelo caminho do
dogmatismo. A modernização das práticas
empresariais e as alterações institucionais que
moldaram essa nova concepção de economia fizeram
necessário adequar o regime falimentar
brasileiro à nova realidade.” 9
Assim, é possível constatar que a Lei
11.101/2005 não apenas resultou de amplo debate com os
setores sociais diretamente afetados por ela, como também
surgiu da necessidade de preservar-se o sistema produtivo
nacional inserido em uma ordem econômica mundial
caracterizada, de um lado, pela concorrência predatória
8 MACHADO, Rubens Approbato. Comentários à Nova Lei de Falências e
Recuperação de Empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 22.
9 Parecer, loc.cit.
entre seus principais agentes e, de outro, pela eclosão de
crises globais cíclicas altamente desagregadoras.
Nesse contexto, os legisladores optaram por
estabelecer que adquirentes de empresas alienadas
judicialmente não assumiriam os débitos trabalhistas, por
sucessão, porquanto, segundo consta do citado parecer
senatorial:
“O fato de o adquirente da empresa em
processo de falência não suceder o falido nas
obrigações trabalhistas não implica prejuízo aos
trabalhadores. Muito ao contrário, a exclusão da
sucessão torna mais interessante a compra da
empresa e tende a estimular maiores ofertas
pelos interessados na aquisição, o que aumenta a
garantia dos trabalhadores, já que o valor pago
ficará à disposição do juízo da falência e será
utilizado para pagar prioritariamente os
créditos trabalhistas. Além do mais, a venda em
bloco da empresa possibilita a continuação da
atividade empresarial e preserva empregos. Nada
pode ser pior para os trabalhadores que o
fracasso na tentativa de vender a empresa, pois,
se esta não é vendida, os trabalhadores não
recebem seus créditos e ainda perdem seus
empregos”.10
Comentando o dispositivo da Lei 11.101/2005, que
isenta os arrematantes dos encargos decorrentes da sucessão
trabalhista, Alexandre Husni assenta o quanto segue:
“A realidade é que visto o fato de
forma econômica, a entidade produtiva mais valor
10 Parecer, loc. cit.
terá na medida em que se desligue dos ônus que
recaiam sobre si, independentemente da sua
natureza. Via de conseqüência, a procura será
maior tanto quanto garanta o Poder Judiciário a
inexistência de sucessão. Pago o preço justo de
mercado, quem efetivamente sai ganhando com o
fato será o credor de natureza trabalhista e
acidentário que são os primeiros na ordem de
preferências estabelecida pelo legislador.” 11
Do ponto de vista teleológico, salta à vista que
o referido diploma legal buscou, antes de tudo, garantir a
sobrevivência das empresas em dificuldades - não raras
vezes derivadas das vicissitudes por que passa a economia
globalizada -, autorizando a alienação de seus ativos,
tendo em conta, sobretudo, a função social que tais
complexos patrimoniais exercem, a teor do disposto no art.
170, III, da Lei Maior.
Nesse sentido, é a lição de Manoel Pereira
Calças:
“Na medida em que a empresa tem
relevante função social, já que gera riqueza
econômica, cria empregos e rendas e, desta
forma, contribui para o crescimento e
desenvolvimento socioeconômico do País, deve ser
preservada sempre que for possível. O princípio
da preservação da empresa que, há muito tempo é
aplicado pela jurisprudência de nossos
tribunais, tem fundamento constitucional, haja
vista que nossa Constituição Federal, ao regular
11 HUSNI, Alexandre. Comentários aos artigos 139 ao 153. In: DE LUCCA,
Newton e SIMÃO FILHO, Adalberto (Coords.). Comentários à Nova Lei de
Recuperação de Empresas e de Falências. São Paulo: Quartier Latin,
2005. p.537-538.
a ordem econômica, impõe a observância dos
postulados da função social da propriedade (art.
170, III), vale dizer, dos meios de produção ou
em outras palavras: função social da empresa. O
mesmo dispositivo constitucional estabelece o
princípio da busca pelo pleno emprego (inciso
VIII), o que só poderá ser atingido se as
empresas forem preservadas.
(...).
Na senda da velha lição de Alberto
Asquini, em seu clássico trabalho sobre os
perfis da empresa como um fenômeno poliédrico,
não se pode confundir o empresário ou a
sociedade empresária (perfil subjetivo) com a
atividade empresarial ou organização produtiva
(perfil funcional), nem com o estabelecimento
empresarial (perfil objetivo ou patrimonial).
Nesta linha, busca-se preservar a empresa como
atividade, mesmo que haja a falência do
empresário ou da sociedade empresária,
alienando-a a outro empresário, ou promovendo o
trespasse ou o arrendamento do estabelecimento,
inclusive à sociedade constituída pelos próprios
empregados, conforme previsão do art. 50, VIII e
X, da Lei de Recuperação de Empresas e
Falências”. 12
Sérgio Campinho, na mesma linha, assenta que a
“alienação judicial (...) tem por
escopo justamente a obtenção de recursos para
cumprimento de obrigações contidas no plano [de
recuperação da empresa], frustrando-se o intento
caso o arrematante herde os débitos trabalhistas
do devedor, porquanto perderá atrativo e cairá
de preço o bem a ser alienado”.13
12 CALÇAS, Manoel de Queiroz Pereira. “A Nova Lei de Recuperação de
Empresas e Falências: Repercussão no Direito do Trabalho (Lei nº
11.101, de fevereiro de 2005)”. Revista do Tribunal Superior do
Trabalho. Ano 73. N. 4. out/dez 2007, p. 40.
13 CAMPINHO, Sérgio. Falência e recuperação de empresa: o novo regime
de insolvência empresarial. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 173.
Isso porque o processo falimentar, nele
compreendido a recuperação das empresas em dificuldades,
objetiva, em última análise, saldar o seu passivo mediante
a realização do respectivo patrimônio. Para tanto, todos os
credores são reunidos segundo uma ordem pré-determinada, em
consonância com a natureza do crédito de que são
detentores.
O referido processo tem em mira não somente
contribuir para que a empresa vergastada por uma crise
econômica ou financeira possa superá-la, eventualmente, mas
também busca preservar, o mais possível, os vínculos
trabalhistas e a cadeia de fornecedores com os quais ela
guarda verdadeira relação simbiótica.
É exatamente o que consta do art. 47 da Lei
11.101/2005, verbis:
“Art. 47. A recuperação judicial tem
por objetivo a superação da situação de crise
econômico-financeira do devedor, a fim de
permitir a manutenção da fonte produtora, do
emprego dos trabalhadores e dos interesses dos
credores, promovendo, assim, a preservação da
empresa, sua função social e o estímulo à
atividade econômica”.
Cumpre ressaltar, por oportuno, que a ausência
de sucessão das obrigações trabalhistas pelo adquirente de
ativos das empresas em recuperação judicial não constitui
uma inovação do legislador pátrio. De fato, em muitos
países, dentre os quais destaco a França (Code de Commerce,
arts. L631-1, L631-13 e L642-1) e a Espanha (Ley 22/2003,
art. 148), existem normas que enfrentam a problemática de
modo bastante semelhante ao nosso.
Na lei falimentar italiana, por exemplo, há
inclusive um dispositivo bastante similar à regra aqui
contestada. Trata-se do art. 105 do Decreto 267/1942, com a
redação que lhe emprestou o Decreto Legislativo 5/2006, que
tem a seguinte redação:
“Salvo disposição em contrário, não
há responsabilidade do adquirente pelo débito
relativo ao exercício do estabelecimento
empresarial adquirido”.14
Por essas razões, entendo que os arts. 60,
parágrafo único, e 141, II, do texto legal em comento
mostram-se constitucionalmente hígidos no aspecto em que
estabelecem a inocorrência de sucessão dos créditos
trabalhistas, particularmente porque o legislador
ordinário, ao concebê-los, optou por dar concreção a
determinados valores constitucionais, a saber, a livre
14 “Salva diversa convenzione, è esclusa la responsabilità
dell’acquirente per i debiti relativi all’esercizio delle aziende
cedute”.
iniciativa e a função social da propriedade - de cujas
manifestações a empresa é uma das mais conspícuas - em
detrimento de outros, com igual densidade axiológica, eis
que os reputou mais adequados ao tratamento da matéria.
Superadas tais objeções, passo agora ao exame do
último argumento da presente ação direta, isto é, o da
inconstitucionalidade da conversão de créditos
trabalhistas, a partir de um certo patamar, em
quirografários.
Também nesse tópico não vejo qualquer ofensa à
Constituição no tocante ao estabelecimento de um limite
máximo de 150 (cento e cinquenta) salários mínimos, para
além do qual os créditos decorrentes da relação de trabalho
deixam de ser preferenciais.
É que – diga-se desde logo - não há aqui
qualquer perda de direitos por parte dos trabalhadores,
porquanto, independentemente da categoria em que tais
créditos estejam classificados, eles não deixam de existir
nem se tornam inexigíveis. Quer dizer, os créditos
trabalhistas não desaparecem pelo simples fato de serem
convertidos em quirografários, mas apenas perdem o seu
caráter preferencial, não ocorrendo, pois, nesse aspecto,
qualquer afronta ao texto constitucional.
Observo, a propósito, que o estabelecimento de
um limite quantitativo para a inserção dos créditos
trabalhistas na categoria de preferenciais, do ponto de
vista histórico, significou um rompimento com a concepção
doutrinária que dava suporte ao modelo abrigado no Decretolei
7.661/1945, cujo principal enfoque girava em torno da
proteção do credor e não da preservação da empresa como
fonte geradora de bens econômicos e sociais.
É importante destacar, ademais, que a própria
legislação internacional de proteção ao trabalhador
contempla a possibilidade do estabelecimento de limites
legais aos créditos de natureza trabalhista, desde que
preservado o mínimo essencial à sobrevivência do empregado.
Esse entendimento encontra expressão no art. 7.1
da Convenção 173 da Organização Internacional do Trabalho –
OIT (Convenção sobre a Proteção dos Créditos Trabalhistas
em Caso de Insolvência do Empregador), segundo o qual a
“legislação nacional poderá limitar o
alcance do privilégio dos créditos trabalhistas
a um montante estabelecido, que não deverá ser
inferior a um mínimo socialmente aceitável”.
Embora essa Convenção não tenha sido ainda
ratificada pelo Brasil, é possível afirmar que os limites
adotados para a garantia dos créditos trabalhistas, no caso
de falência ou recuperação judicial de empresas, encontram
respaldo nas normas adotadas no âmbito da OIT, entidade
integrante da Organização das Nações Unidas, que tem por
escopo fazer com que os países que a integram adotem
padrões mínimos de proteção aos trabalhadores.
Nesse aspecto, as disposições da Lei 11.101/2005
abrigam uma preocupação de caráter distributivo,
estabelecendo um critério o mais possível equitativo no que
concerne ao concurso de credores. Em outras palavras, ao
fixar um limite máximo – bastante razoável, diga-se - para
que os créditos trabalhistas tenham um tratamento
preferencial, a Lei 11.101/2005 busca assegurar que essa
proteção alcance o maior número de trabalhadores, ou seja,
justamente aqueles que auferem os menores salários.
Procurou-se, assim, preservar, em uma situação
de adversidade econômica por que passa a empresa, o caráter
isonômico do princípio da par condicio creditorum, segundo
o qual todos os credores que concorrem no processo de
falência devem ser tratados com igualdade, respeitada a
categoria que integram.
Esse é o entendimento de Fábio Ulhoa Coelho,
para quem o limite à preferência do crédito trabalhista tem
como objetivo
“impedir que (...) os recursos da
massa [sejam consumidos] com o atendimento a
altos salários dos administradores da sociedade
falida. A preferência da classe dos empregados e
equiparados é estabelecida com vistas a atender
os mais necessitados, e os credores por elevados
salários não se consideram nessa situação”.15
Insta sublinhar, ainda, que o valor estabelecido
na Lei não se mostra arbitrário e muito menos injusto,
afigurando-se, ao revés, razoável e proporcional, visto
que, segundo dados do Tribunal Superior do Trabalho,
constantes do já citado parecer da Comissão de Assuntos
Econômicos do Senado Federal,
“o limite superior de 150 salários
mínimos (...) afetará número reduzidíssimo de
assalariados, entre os quais estão, exclusiva ou
primordialmente, os ocupantes de cargos elevados
da hierarquia administrativa das sociedades”. 16
Isso porque as indenizações trabalhistas,
levando-se em conta os valores vigentes à época da edição
do diploma legal, foram, em média, de 12 (doze) salários
mínimos.
15 COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Nova Lei de Falências. São Paulo:
Saraiva, 2005, p. 14.
16 Parecer, loc.cit.
Foi precisamente o dever estatal de proteger os
direitos dos trabalhadores que determinou a fixação de
regras que tornem viável a percepção dos créditos
trabalhistas pelo maior número possível de credores, ao
mesmo tempo em que se buscou preservar, no limite do
possível, os empregos ameaçados de extinção pela eventual
quebra da empresa sob recuperação ou em processo de
falência.
Em abono dessa tese, afirma o já citado Manoel
Pereira Calças que:
“O Estado deve proteger os
trabalhadores que têm como ‘único e principal
bem sua força de trabalho’. Por isso, tanto na
falência, como na recuperação judicial, os
trabalhadores devem ter preferência no
recebimento de seus créditos, harmonizando-se,
no entanto, tal prioridade, com a tentativa da
manutenção dos postos de trabalho.
(...)
(...) o credor trabalhista, cujo
crédito somar até cento e cinquenta saláriosmínimos,
será classificado pela totalidade do
respectivo valor na classe superpreferencial; já
o trabalhador que for titular de crédito que
supere o teto legal participará do concurso em
duas classes distintas, ou seja, pelo valor
subsumido no teto integrará a classe dos
créditos trabalhistas e pelo valor excedente
será incluído na classe dos quirografários”. 17
17 CALÇAS, Manoel de Queiroz Pereira. “A Nova Lei de Recuperação de
Empresas e Falências: Repercussão no Direito do Trabalho (Lei N.
11.101, de fevereiro de 2005)”. Revista do Tribunal Superior do
Trabalho. Ano 73. nº 4. out/dez 2007, p. 41.
Essa restrição, contudo, de forma acertada, como
asseveram Vera de Mello Franco e Rachel Sztajn “não atinge
as indenizações devidas por acidente do trabalho, que devem
ser pagas integralmente”. 18 Ademais, assentam que:
“Caso o apurado com a venda dos
ativos seja insuficiente para a satisfação do
total, procede-se ao rateio, em igualdade de
condições, dentre os credores trabalhistas e
preferenciais, classificados nesta classe”.19
Assim, forçoso é convir que o limite de
conversão dos créditos trabalhistas em quirografários
fixado pelo art. 83 da Lei 11.101/2005 não viola a
Constituição, porquanto, longe de inviabilizar a sua
liquidação, tem em mira, justamente, a proteção do
patrimônio dos trabalhadores, em especial dos mais débeis
do ponto de vista econômico.
Assento, por fim, que não encontro nenhum vício
na fixação do limite dos créditos trabalhistas, para o
efeito de classificá-los como quirografários, em salários
mínimos, pois o que a Constituição veda é a sua utilização
como indexador de prestações periódicas, e não como
parâmetro de indenizações ou condenações, de acordo com
remansosa jurisprudência desta Suprema Corte.
18 FRANCO, Vera Helena de Mello e SZTAJN, Rachel. Falência e
Recuperação de Empresa em Crise. São Paulo: Elsevier, 2009, p. 42-43.
19 Idem, loc.cit.
Isto posto, conheço e julgo improcedente a
presente ação direita de inconstitucionalidade.


Maria da Glória Perez Delgado Sanches

Membro Correspondente da ACLAC – Academia Cabista de Letras, Artes e Ciências de Arraial do Cabo, RJ.

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